ALÉM DO ATRASO no cumprimento do cronograma das obras da Copa do Mundo de 2014, que vem gerando especulações sobre a possível substituição de Natal por outra capital, há outra polêmica irritando, dessa vez, dirigentes ligados ao esporte do Rio Grande do Norte. Alijados das discussões sobre o futuro do Mundial na capital do estado, cartolas encorpam o discurso do presidente da Federação Norte-riograndense de Futebol, José Vanildo da Silva, que se diz desrespeitado pela ausência da FNF do debate, e cobram a participação da entidade nas resoluções tomadas pelo governo sobre a Copa.
José Vanildo não poupa o poder público envolvido no projeto da Copa do Mundo e critica de forma veemente os que negociam as obras em nome do Estado. Para ele, o foco do Mundial deveria ser o futebol. “Vejo tudo isso como uma falta de respeito. O que está havendo hoje em dia é um bando de oportunistas, políticos carreiristas, empreiteiros, agentes de turismo e hoteleiros que têm todo o direito de pleitear e buscar recursos, mas agem com uma total falta de atenção ao objetivo que trata da Copa. Ninguém está tratando do fator mais importante. É bom ter outro aeroporto, um novo sistema viário, a mobilidade urbana, mas e quem faz o futebol? Ninguém está preocupado se vai ou não vai haver campeonato estadual no próximo ano e onde os clubes vão jogar. Talvez nem tenha estadual em 2011”, ameaçou o dirigente. Vanildo conta que, até o momento, só foi convidado para “compor mesa e fazer número. Mas isso já não me motiva porque não vejo reciprocidade. Sou a favor da Copa, mas deve haver um maior interesse das cidades”.
Sobre o futuro do Machadão, o presidente da FNF não se opõe à demolição do estádio para a construção da Arena das Dunas, mas apenas caso o estado tenha dinheiro sufi ciente para manter o projeto. Indagado sobre um plano B para substituir o estádio de Lagoa Nova no estadual do próximo ano, Vanildo perdeu o controle. “Se a federação não é ouvida para porra nenhuma, como é que existe um plano B!”, retrucou para logo em seguida revelar um projeto de readequação do estádio Juvenal Lamartine que, além de 95% dos jogos realizados em Natal no campeonato estadual, poderia, segundo ele, servir de apoio para as seleções que virão para Natal durante a Copa do Mundo de 2014. Entregue este ano à prefeita de Natal, Micarla de Sousa, o projeto do ‘novo’ estádio Juvenal Lamartine custaria R$ 15 milhões – R$ 3 milhões a menos que a última reforma do Machadão – e incluiria a construção de um centro cultural com 27 lojas; novo módulo de arquibancadas tipo tobogã por trás de um dos gols; construção do Museu do Futebol; um restaurante e a nova sede da FNF que ofereceria escolinha de futebol destinada principalmente aos moradores de Mãe Luíza e academia de ginástica. “Para manter a tradição do estádio, manteríamos o mesmo formato das arquibancadas atuais, de madeira. Apresentamos o projeto para a prefeita, que fi cou muito entusiasmada. Acho que a readequação do Juvenal Lamartine poderia muito bem ser incorporado no projeto da Copa. Até porque serviria de campo de treinamento para as seleções que virão no Mundial”, afi rmou.
DIRIGENTES QUEREM FNF COMO PROTAGONISTA
Os cartolas e dirigentes ligados aos principais clubes do Estado também defenderam a presença de quem, realmente, faz o futebol potiguar junto à comissão local que vem discutindo a Copa de 2014. Para o presidente do Alecrim, Orlando Caldas, o mandatário da FNF deveria ser o principal nome do grupo que debate o Mundial. “Se o presidente do Corínthians quiser falar com o Ricardo Teixeira não fala porque dirigentes de clubes têm que manter contato através dos presidentes das federações, esses sim falam com a CBF. Ou seja, José Vanildo é o representante legal do estado junto à Confederação.
E é um absurdo que ele não seja o braço direito neste debate. E se o Machadão for mesmo demolido, onde é que os clubes vão jogar? No Frasqueirão, como na vez que o Judas Tadeu cobrou R$ 20 mil pelo aluguel do estádio? O Alecrim até conseguiria jogar, mas para o América eles não liberariam”, analisa.
Tranquilo em relação às conseqüências para o clube com a possível derrubada do Machadão, já que conta com um estádio próprio, o presidente do ABC, Rubens Guilherme, também defende a participação
da FNF nos debates da Copa. “Acho que realmente precisa haver uma participação da Federação; é o órgão que faz o campeonato e deveria ser ouvida. Já em relação ao estádio, o ABC está bem, temos a nossa casa” disse.
O ex-presidente do ABC, Judas Tadeu, cobra a presença dos clubes nas discussões. “Não estão ouvindo as pessoas do segmento esportivo e acho que deveriam estar presentes. ABC e América também poderiam participar”, sugeriu.
SEM CAMPO
Somada às preocupações dos demais dirigentes do futebol potiguar, está uma inquietação dos cartolas americanos: ficar sem estádio. Com a expectativa da derrubada do Machadão se torna cada vez maior a preocupação dos alvirrubros se, efetivamente, a Arena das Dunas será construída. Para o ex-presidente do clube e ex-secretário estadual de Turismo, Jussier Santos, o projeto é “megalomaníaco” e não há garantias de que um novo estádio será erguido depois da derruba do Machadão. “Isso é uma loucura total. Se derrubarem o Machadão ficaremos sem estádio, ninguém é doido de fazer um investimento aqui sem a garantia do retorno”, afirmou ele.
Santos aproveitou para criticar a postura do Governo do Estado que, segundo ele, estaria gastando “rios de dinheiro” em consultorias, apesar de uma solução já ter sido encontrada pelo arquiteto do Machadão, Moacyr Gomes. “Na minha visão todo esse procedimento só está servindo para os consultores ganharem dinheiro. O governo do estado gastou o que não pode, quando a solução já tinha sido encontrada há mais de um ano com a adequação da praça”.
“Me posicionei desde o primeiro momento contra e entendo que se esse for o preço para ter dois jogos da Copa, ganhamos muito mais usufruindo do fluxo turístico entre Fortaleza e Recife”.
No final, promete: “Estou no Rio [de Janeiro], volto em breve e vou me engajar em qualquer procedimento contrário a essa loucura”.
Menos radical, o atual presidente do América, José Maria Figueiredo se mostra favorável à Copa, mas reclama do distanciamento dos clubes nas discussões. “Vejo com muita tristeza. O Poder Público teria que ter um plano B para os clubes. Aonde vamos jogador próximo ano? Vamos ter que nos afastar dos nossos torcedores jogando em Campina Grande ou em João Pessoa? Como vamos manter uma folha de R$ 500 mil sem renda?” questiona.
E, assim, como o ex-presidente Zé Maria mostra preocupação se o sonho da Arena das Dunas se tornará realidade. “Se derrubarem, vão ter dificuldade para construírem outro. E mesmo assim não é de uma hora para outra. O América deverá sofrer muito com isso”.
CRAQUES SE DIVIDEM
Jogadores de futebol que brilharam com as camisas dos clubes locais e das Seleções Brasileira e Uruguaia, Alberi, Souza e Danilo Menezes, também se manifestaram sobre a polêmica ausência da FNF no debate sobre a Copa do Mundo. Para o uruguaio Danilo Menezes, campeão pelo ABC nos anos 70, o fato do futebol do estado não estar representado pela FNF nas discussões é indício de que algo não vai bem. Ele, inclusive, coloca em xeque a participação de Natal no Mundial daqui a quatro anos. “A ausência de José Vanildo, que é um representante da CBF no estado, é um dos indicadores de que a coisa não é como a gente está pensando. Essa demora toda para começar as obras mostra que não há nada de defi nitivo que diga que Natal é uma das sedes. Até porque a FIFA precisa fazer a Copa em apenas oito sedes. Depois daquela festa em Ponta Negra no dia ao anúncio de Natal como cidade-sede não mudou nada”, afi rmou.
Já Alberi e Souza, maiores estrelas da história de ABC e América, respectivamente, preferiram um discurso mais ameno. Ambos acreditam na Copa em Natal e esperam que o que acontecer seja o melhor para o Estado. “Esse negócio de Castelão [Machadão] é muito complicado. Se a gente for dizer uma coisa boa tem muita gente para dizer que é ruim e vice versa.
Eu já dei minha opinião, não sou contra nada. Quero o que for melhor para o RN”, disse Bola de Prata de 1972.
Souza segue a mesma linha, mas torce para que as obras ocorram com maior celeridade. “Quero que as coisas aconteçam, e o mais rápido possível. Até porque a Copa está sendo ameaçada. Derrubando ou não o Machadão, temos que torcer para que seja o melhor para o RN. Tenho um carinho muito grande pelo Machadão, até porque foi ali que comecei, mas não sou egoísta a ponto de colocar minha história à frente de um projeto como esse”, disse.